Amanhece! É hora da caminhada matinal. Rapidamente me coloco em pé.
Roupa adequada, tênis confortável, um rápido desjejum.
Cerca de meia hora depois já me encontro pronta  para colocar o pé na estrada.
Está frio lá fora. Ainda é muito cedo. Mas o vento frio no rosto é revigorante. Alguns passos e já me encontro aquecida.
Ando algumas quadras até pegar a estrada.
O vizinho da rua de cima já vem retornando.  Um rápido cumprimento.
-Bom dia, bom dia! Levantou cedo, não?

Mais adiante a senhorinha que encontro sempre. Toda vez que a encontro me admira  o modo como se expõe ao frio da manhã.  Nunca está bem agasalhada. Aliás, eu assim penso. Porque eu como sou friorenta me  agasalho muito bem. Mas, ela também é madrugadeira . Já se encontra quase no portão de casa. Como sempre portando uma vara numa das mãos.
Imagino que seja para se defender de um possível ataque  dos cães que sempre pregam susto nos passantes numa porteira de uma fazenda logo adiante.

Num outro dia eu também quase  fui vítima de um ataque desses.
Levei um susto daqueles. Tive que me proteger e rapidamente buscar o primeiro pedaço de pau que avistei.
Só assim intimidei o cão. A partir desse dia passei a imitar a senhorinha.
Escolhi uma boa vara que me desse proteção e a deixo  escondida num buraco atrás de um poste logo que pego a estrada.  É só chegar e pegar.
Mas há pessoas que não se intimidam. Vão e voltam tranquilamente, seguras de si.

A “família que caminha unida” também já vem voltando. Pai e mãe já idosos e uma moça de  meia idade. Madrugadores também.
Uma caminhonete passa por mim. A moça me acena. Mora numa fazenda próxima e todos os dias leva os filhos à escola.
Enquanto muitos já estão de retorno, também tem os mais atrasados  que eu. Alguns passam por mim a passos largos. Outros vêm logo atrás.
Eu prefiro caminhar mais devagar  e apreciar detalhadamente tudo a meu redor.

Depois de grande trecho percorrido, paro embaixo da figueira. Aliás, não teria como não ficar à sua sombra. Sua copa toma quase que a estrada toda. Eu penso que é centenária. Alguns  dizem que  à noite é mal assombrada. Mas o sol nascente visto por entre seus galhos é um cenário maravilhoso.
Muito bom ficar aqui , debaixo dessa frondosa figueira, tomando fôlego e admirando a natureza. Mas é preciso ficar atenta com os cães do lado oposto..

Do outro lado da estrada, diante da porteira estão os cães a postos. Felizmente o motoqueiro que todo dia pela manhã sai por aquela porteira, já passou por mim. E, invariavelmente os cães saem latindo freneticamente perseguindo a moto. Vão até um trecho da estrada e voltam decepcionados por não conseguirem segui-la. Acomodam-se então ao lado da porteira. É nessa hora que mora o perigo de algum ataque.

Bem, mas já é hora de voltar. O trecho percorrido varia entre 2,5 a 3 km. Somando ao retorno, já foi uma boa caminhada.
Abro os olhos e vem a decepção.  Eu me encontro na cama. Foi apenas um sonho...

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Este texto foi escrito por mim há uns três anos atrás. Impossibilitada de caminhar em razão de um pequeno acidente que me deixou fora de área por pelo menos um ano, eu até sonhava com minhas caminhadas matinais. Ao mesmo tempo que sonhava retomá-las, intimamente invadia-me uma insegurança , um medo de não mais poder fazê-lo como antes.  Todo o relato, o cenário , inclusive os cães faziam parte do meu roteiro diário. 
 E, como os sonhos são um retrato daquilo que nos incomoda ou que alegra , esse momento ficou guardado no meu subconsciente e veio à tona em forma de sonho...
Ah, e a figueira hoje não existe mais . Precisaram cortá-la . Para mim ela fazia parte do acervo histórico da cidade. Já nem caminho mais por lá, a estrada está muito movimentada e já houve acidentes graves , casos de morte mesmo naquele trecho. Melhor evitar....E depois, nem tem mais a figueira...